Mulheres

que cantam e encantam o "Diário de Naná
Conheça um pouco da história de Virgínia Rodrigues, Gaiaku Luiza, Dona Edith do Prato, Dalva do Samba e Mãe Filhinha, que guiam a viagem do percussionista pernambucano, Naná Vasconcelos pela musicalidade do recôncavo baiano.

Virgínia Rodrigues

Da infância pobre em Salvador ao posto de diva da música brasileira que alcançou mais reconhecimento no exterior do que em seu próprio país, a cantora baiana Virgínia Rodrigues percorreu um longo caminho. Naquele espaço, onde surgira nos anos 60 o movimento Tropicalista, Caetano Veloso foi apresentado à Virgínia e às suas técnicas de canto lírico e referências populares que trazia da infância tomada pela diversidade radiofônica da época e pelo ritmo das procissões que frequentava com a avó. O encontro (e o encanto) aconteceu em um ensaio da peça Bye bye Pelô, na qual Virgínia cantava uma música tradicional na procissão do Senhor Morto, realizada durante a Semana Santa, parte do imaginário afetivo do jovem Caetano na cidade de Santo Amaro da Purificação. Não demorou para o projeto de um disco com a cantora sair do papel, com direção artística do próprio Caetano.

Desde então a cantora gravou três discos pela Natasha Records, Sol Negro (1997), Nós (2000) – uma seleção do repertório dos blocos afro da Bahia -, e Mares Profundos (2003), com releituras dos afro sambas de Vinicius de Moraes e Baden Powell. Em 2008, a cantora lança Recomeço  (Biscoito Fino), um disco de voz e piano com o músico Cristóvão Bastos. O encontro do erudito com o popular é mote dos quatro trabalhos de Vírginia Rodrigues, intrumentos de sopro, cordas e percussão, aliados ao canto de verve lírica e ao excelente repertório – uma mistura de resgate de canções tradicionais do nordeste, canto popular e MPB, além, é claro, de muita reverência a toda sua ancestralidade Banto. Essas qualidades agradaram um público mais tímido no Brasil e audiências mais entusiastas nos EUA e na Europa. Um dos admiradores ilustres da cantora é Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos, que a conheceu em uma visita oficial ao Brasil em 1997, e teve uma apresentação da cantora em sua homenagem, em 2001, quando Clinton retornou ao país para uma palestra em São Paulo.

No final de 2010, Virgínia Rodrigues se apresentou em palcos cariocas, na programação do Solar de Botafogo – espaço que nasceu dedicado ao teatro e que recentemente inaugurou suas sessões musicais com excelente programação. O show, com o violonista Alex Mesquita e participações do violoncelista Iura Ranevsky  e de Bnegão, trazia um apanhado da carreira da cantora, que pretende transportar o formato do show para um disco. Outro projeto de Virgínia é o lançamento de um álbum só com músicas em Quicongo e Quimbundo, duas línguas africanas, como fez o músico baiano Taingá Santana – único cantor brasileiro a gravar um disco em línguas africanas. “Vou ser a segunda artista brasileira a gravar em Quicongo e Quimbundo,  porque o primeiro foi ele”, afirma a cantora baiana.

Fonte:
“Virgínia Rodrigues: a voz de alguém quando vem do coração”. Bruno Duarte e Marcio Debellian (foto1: Tomás Rangel). Saraiva Conteúdo.

Mais informações:
Entrevista exclusiva de Virgínia Rodrigues ao Saraiva Conteúdo


Naná Vasconcelos e Virgínia Rodrigues 




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Gaiaku Luiza
Uma das mais importantes sacerdotisas das chamadas religiões de matriz africana do século XX, Gaiaku Luiza de Oyá, faria amanhã, se estivesse viva, 100 anos. O legado desta senhora se fundamenta num saber litúrgico impressionante acerca das várias nações de candomblé, o Angola, o Ketu, o Jeje, e essa variância de complexa tradução, sua marca mais precisa, pode ser verificada na criação de um terreiro inteiramente dedicado ao Jeje-Mahi, nos idos de 1959, na bela e negra cidade de Cachoeira.
D. Luiza de Oyá, mãe de muita inspiração espiritual, faleceu no dia 20 de junho de 2005, em seu templo religioso, o Húnkpámè Ayíonó  Huntóloji, casa que ilustra a grandeza desta sacerdotisa tão pouco conhecida dos baianos e brasileiros. Foi-se aos 95 anos de uma vida longeva, lúcida, comunicativa, criadora e sábia. A sabedoria foi a marca principal da Gaiaku que carregava o vodum das tempestades e do silêncio mortuário, rainha do branco na ligação da terra aos céus, morada dos nossos maiorais: Oyá, conhecida também, pelos filhos do Ketu, como Iansã.
Luiza Franquelina da Rocha viveu as delícias e agruras do povo-de-santo cachoeirano, nascendo no seio do candomblé, respirando os ares de uma recente abolição da escravatura, num universo racista que não respeitava as tradições religiosas de origem africana reinventadas no Brasil. Uma mulher nascida em 1909, de beleza e inteligência raras, que percorreu quase todo o século XX salvaguardando a liturgia desta nação ritual tão pouco conhecida de nós todos. Mais que baluarte, ela foi mestra pedagógica do que chamamos, em síntese, de candomblé. Recebia a todos em sua casa, sentada em sua cadeira, hospitaleira e majestosa, para mim, foi a real imperadora desta religião tão rica de significados, porque abrigava como mãe, ensinava como mestra, distraía como amiga, aconselhava em sua sabedoria, enriquecia-nos com palavras e iluminava como sacerdotisa. Que tardes deliciosas ela nos proporcionava com sua memória prodigiosa; quantas histórias e quanta luz de uma intelectualidade construída fora das formas das academias.
D. Luiza era uma espécie de tempero celeste que nos fazia imaginar outras senhoras do candomblé, como D. Aninha de Afonjá, a saudosa Obá Biyi, fundadora do Ilê Axé Opô Afonjá. Gaiaku Luiza corporificava sua cidade Cachoeira, com uma presença de espírito que a colocava como uma cidadã do mundo, que morou em outros lugares, como Salvador e Rio de Janeiro.
Oyá venta a memória de sua filha entre nós. Gaiaku, como era chamada respeitosamente, deixou seguidores; entre as mais coadunadas aos ensinamentos da grande mãe, está Mãe Zulmira de Nanã, potentado de saber, ligação entre três nações de candomblé – o Jeje-Mahi, o Ketu e o Angola, nação pela qual Mãe Zulmira cultua, em seu terreiro em Lauro de Freitas, as entidades legadas por nossos ancestrais africanos. 

Fonte:
O Legado de Gaiaku Luiza, por Marlon Marcos. Jornal “A Tarde”

Mais informações:
Gaiaku Luiza (trecho do livro “Gaiaku Luiza e atrajetória do jeje-mahi”, de Marcos Carvalho)


Gaiaku Luiza no documentário "Diário de Naná" 





Documentário “Gaiaku Luiza: força e magia dos voduns” (Direção: Soraya Mesquita)




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Dona Edith do Prato
(Edith Oliveira Nogueira)

Começou como cantora de sambas de roda em Santo Amaro da Purificação (BA), quase todos de domínio público. Cantava se acompanhando com uma curiosa percussão, raspando uma faca em um prato, origem de seu nome artístico, extraindo um som extremamente animado.

Sua estreia artística ocorreu no início da década de 70, em Feira de Santana (BA), em um grupo de teatro amador, do qual fazia parte o jornalista Luís Pimentel. Em 1973, gravou pela primeira vez, cantando alguns sambas de roda tradicionais no disco "Araçá azul", de Caetano Veloso, nas faixas "Viola meu bem" e "Sugar Cane Fields Forever". O primeiro CD saiu somente em 2003, "Vozes da Purificação", produzido por J. Veloso e inaugurando o selo Quitanda, da cantora Maria Bethânia. O segundo trabalho lançado foi o DVD "Dona Edith do Prato e Vozes da Purificação", lançado em 2006, e posteriormente lançado também em CD.

Edith do Prato é reconhecida como um ícone sonoro da música tradicional da Bahia, representante dos sambas e chulas, assim como fora Clementina de Jesus anteriormente com o samba carioca. É admirada por diversos críticos músicos e artistas, que conhecem de perto seu trabalho, como Maria Bethânia, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Roque Ferreira, Mariene de Castro, entre outros. Dona Edith faleceu em 09 de janeiro de 2009, em consequência de um acidente vascular cerebral.

Fonte:

Mais informações:
Dona Edith do Prato canta com Caetano Veloso,Dazinho e Rodrigo Veloso em Santo Amaro


Mariene de Castro sobre Dona Edith do Prato

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Dalva do Samba

Dalva Damiana de Freitas, nascida em 1927, é um ícone do samba de roda de Cachoeira. Ela trabalhava na extinta fábrica de charutos Suerdieck, onde, com suas companheiras, passou a organizar um grupo de samba de roda que existe há mais de 40 anos. Além de coordenar o Samba de Roda Suerdieck, Dona Dalva é integrante da Irmandade da Boa Morte.

Há mais de 20 anos, ela mantém o Samba de Roda Mirim Dalva Xodó, que reúne crianças e adolescentes carentes em permanente continuidade na tradição do samba, desenvolvendo indumentárias e instrumentos de trabalho de educação patrimonial.

Dalva Damiana só estudou até o “segundo livro”, o que corresponde ao ensino fundamental, mas tem uma história de vida vasta, que representa a cultura de Cachoeira, a tradição do samba de roda, a religião e os costumes do Recôncavo da Bahia.

Já recebeu diversas homenagens, dentre elas como Griô, pela sua contribuição para a cultura popular na cidade de Cachoeira e para o Samba de Roda como um Patrimônio da Humanidade. Já palestrou sobre assuntos referentes ao Patrimônio Imaterial “Samba de Roda do Recôncavo” para diversos grupos sociais e educacionais, sendo várias vezes objeto de estudos acadêmicos.

Possuidora de um vasto repertório musical, contribuiu significativamente para o Samba de Roda do Recôncavo baiano como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil e Obra Prima do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade: o primeiro título reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e o segundo pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

Atualmente Dona Dalva é aposentada, integrante da Irmandade da Boa Morte e preside a Associação Cultural do Samba de Roda “Dalva Damiana de Freitas”, em que possui como parceira a Associação de Pesquisa em Cultura Popular e Música Tradicional do Recôncavo.

Fonte:
Jornal Reverso e Blog Cachoeira Online

Mais informações:
“O samba não pode morrer”. Entrevista de Dalva Damiana. Reverso- Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da UFRB Cachoeira/BA. n. 04. Dez/2007. 


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Mãe Filhinha
Com 108 anos, "Mãe Filhinha" (Narcisa Cândida Conceição) é a mais antiga das irmãs da Irmandade da Boa Morte, em Cachoeira (BA).

A mais antiga das irmãs é Mãe Filhinha, cuja própria história é feita de mito e ancestralidade. Era ainda muito pequena quando avistou Iemanjá chamando-a para dentro das águas, num lugar conhecido como Porto Preto, lá pelas banda do Rio Paraguaçu. Salvou-se quando a água estava quase cobrindo seu corpo. "Sabe meu filho, eu sou tão das águas que vim ao mundo no meio de um riacho. Então minha mãe me pegou dentro da saia e me levantou, escorrendo água por todos os lados. Quando eu nasci, fui coada", conta ela que, foi declarada filha de Iemanjá Ogunté no terreiro de Zé da Lama, em São Gonçalo dos Campos, cidade próxima à Salvador, nos idos da  década de 40. Levou um ano "suspensa", como ela diz: "Seis meses dentro e mais seis meses do lado de fora da roça em que eu fui feita. Só depois é que eu abri, com todos  os direitos, minha casa, o Ilê Axé Itaylê". O significado do nome, como manda a tradição de família e da nação nagô-vodunce, não pode ser revelado.

É representante máxima do fluxo em que "o mito eterniza e o rito faz repetir o que deuses, heróis e ancestrais teriam lançado como conhecimento verdadeiro do mundo, ab origine", Mãe Filhinha considera sua entrada na irmandade o ato que salvou sua vida: "Eu fazia panela de barro, sentada aqui, nesse chão. Era uma vida triste. Isso eu não tenho vergonha de dizer a ninguém. Até o dia  em que levei três noites sonhando com Nossa Senhora da Boa Morte. Depois, dentro do sonho mesmo, em que eu estava encafifada com ela, eu disse, 'Oh! Minha Mãe, se vós tem vontade de eu caminhar, dar uns passos  com vós, vós me ajude, me tire dese fracasso em que estou'. Ela me ajudou e foi assim que entrei para a irmandade, e dela só saio depois de morta".

Fotos: Adenor Gondim
Fonte:

Olhos que o tempo não esquece. Diógenes Moura/fotos: Adenor Gondim. Revista Mag!. Ano 02. 2006.

Documentário “Mãe Filhinha 105 anos de oferenda à Iemanjá” (Direção: Lu Cachoeira)



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